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Sobre o conflito Israel-Hamás 

© DR

No momento em que escrevo, o mundo está ainda em choque com o bombardeamento do hospital Al-Ahli, na Faixa de Gaza, em resultado do qual terão ocorrido dezenas, senão centenas, de mortes. 

Não sei se foi um míssil de Israel ou um míssil do Hamás. 

Não sei se alguém já o sabe. 

Não sei se alguém jamais o saberá. 

Mas julgo saber que, se foi Israel, terá cometido um tremendo e trágico erro. 

Israel é irrepreensível? Não necessariamente. Mas os seus dirigentes não hão de ser tão estúpidos que perpetrem deliberadamente um ato tão danoso para a sua imagem. 

A mesma lógica NÃO se aplica ao Hamás, o qual entende não ter nada a perder, para o qual quanto pior melhor, para o qual a vida humana não conta, pois aos palestinos mortos no âmbito de um combate contra Israel aguardam-nos as delícias do Paraíso eterno. 

Ouvi há dias um comentador dizer que, se reconhecesse a existência de um Estado palestino, Israel ficaria até mais seguro, pois esse Estado teria forças armadas regulares, em lugar de um movimento como o Hamás, que atua sem regras. 

Mas a isso pode Israel contrapor apontando o Líbano, um país reconhecido internacionalmente, criado no rescaldo da desintegração do império Otomano após a Primeira Guerra Mundial para ser a pátria dos árabes cristãos (maronitas), mas que hoje é um Estado falhado, sem estruturas civis ou militares funcionais, onde quem manda de facto é um movimento islamista irregular (o Hezbollah, émulo do Hamás), onde os cristãos (ainda que árabes, note-se) são uma minoria cada vez mais exígua. Em 2005, Israel retirou-se da faixa de Gaza, que colonizava e controlava militarmente (como neste momento a Cisjordânia). Disse-se que o primeiro-ministro israelita Ariel Sharon queria testar como ficaria a Cisjordânia se o exército israelita a desocupasse. A verdade é que, em Gaza, o Hamás se substituiu rapidamente à Autoridade Palestiniana (para a qual fora transferido o poder); e essa substituição não foi pacífica: nas ruas de Gaza houve combates entre a Autoridade Palestiniana e o Hamás, que deles saiu vitorioso; os militantes do Hamás perseguiam os representantes da Autoridade Palestiniana até em hospitais onde estes agonizavam, atirando-os pelas janelas (que não eram de andares térreos). As infraestruturas destinadas aos anteriores colonos israelitas (escolas, laboratórios, institutos) foram transformadas em bases para a guerra do Hamás contra Israel. O Hamás, à semelhança do Irão, o Estado que o fomenta e arma, não contempla sequer o direito de Israel à existência. Se teste houve por parte de Ariel Sharon, o resultado não foi de bom augúrio. 

Gaza, prisão a céu aberto, com um comprimento de 41 km e uma largura de 6 (na parte mais estreita) a 12 (na parte mais larga), onde se amontoam dois milhões de palestinos… 

Em 1982, fui com um grupo de viajantes a Israel e ao Egito. El Al de Lisboa a Telavive, digressões de autocarro por Israel, Telavive-Cairo de autocarro, Egyptair do Cairo a Madrid, por fim TAP para Lisboa. Em autocarro israelita, entrámos por Erez na faixa de Gaza, que atravessámos em todo o comprimento até ao Egito, provavelmente na fronteira de Rafah, onde mudámos para um autocarro e um motorista egípcios. Nesse tempo, Gaza era um território aparentemente tranquilo, onde as pessoas circulavam com normalidade pelas ruas. Quase todos árabes, poucos ou nenhuns israelitas. 

Ora, culturalmente, o mundo árabe não é propenso ao controlo da natalidade. No caso de Gaza, junta-se o estímulo ao engrossamento das fileiras dos combatentes. As famílias palestinas crescem e multiplicam-se. Não há saídas por terra, bloqueadas do lado de Israel (circunstância que revolta as consciências ocidentais), bloqueadas igualmente do lado do Egito irmão (circunstância que, essa, não parece afetar grandemente as consciências ocidentais). O mar de Gaza é vigiado pela marinha israelita, que, alegando razões de segurança, apenas autoriza atividades de pesca. Portanto, hoje, a faixa de Gaza é um formigueiro atravancado. Em territórios geograficamente exíguos mas socialmente desenvolvidos — Singapura, Mónaco, Listenstaina — a população aderiria a programas de controlo demográfico e criaria normas de ordenamento urbano. Mas, para o Hamás, que é quem de facto governa, desenvolvimento é sobretudo no domínio militar. Tecnicamente, não há aqui responsabilidade de Israel. 

Jorge Madeira Mendes

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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