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Produtores de calçado esperam a retoma

A insuficiência de encomendas lidera as dificuldades sentidas pelo setor do calçado, cujas exportações acumulavam até julho uma quebra de 9% em quantidade e 1% em valor, mas empresas ouvidas pela Lusa na feira MICAM resistem à tendência.

A Fábrica de Calçado Penha – empresa de Guimarães que se estreia este ano na maior feira de calçado do mundo, em Milão, Itália – perspetiva para este ano “seguramente um crescimento a dois dígitos” face aos 4,62 milhões de euros faturados no ano recorde de 2022, impulsionado pelos mercados da França (responsável por 80% do volume de negócios) e da Suécia.

Em entrevista à agência Lusa no primeiro de quatro dias do certame, o administrador e proprietário da empresa de calçado clássico admite, contudo, que as potenciais dificuldades resultantes do abrandamento económico internacional o “inquietam” e justifica a estreia na MICAM com o desejo de “abrir janelas para passar à terceira geração uma empresa sólida e com estrutura”.

“Será que o mercado europeu pode entrar em recessão, com a guerra? Estamos consolidados na Europa, por isso o melhor é estarmos preparados para começar a pensar em mercados alternativos”, afirmou Armindo Morais.

Após um ano recorde de 2022 em que as exportações da indústria portuguesa de calçado cresceram 10% em volume e mais de 20% em valor, superando a marca histórica dos 2.000 milhões de euros, os últimos dados disponíveis apontam para uma quebra acumulada até julho de 9% em quantidade e 1% em valor, para 43 milhões de pares de sapatos e 1.171 milhões de euros, respetivamente.

A inflação impulsionou um aumento do preço médio por par exportado, que cresceu quase 10%, para 27,30 euros, mas o facto é que a escassez de encomendas começa a preocupar os empresários.

“A insuficiência de encomendas de clientes estrangeiros voltou à liderança das dificuldades enfrentadas pelas empresas do setor, depois de dois anos em que esse lugar coube ao abastecimento de matérias-primas”, aponta a análise trimestral de conjuntura relativa ao segundo trimestre deste ano, divulgada pela Associação Portuguesa dos Industriais do Calçado, Componentes e Artigos de Pele (APICCAPS).

Embora a maioria das empresas continue a considerar que o estado dos negócios é suficiente ou bom e tenham diminuído as referências à escassez de mão de obra qualificada, a carteira de encomendas e a produção diminuíram e, para o próximo trimestre, prevê-se “a manutenção destas tendências, com um ligeiro agravamento da insuficiência de encomendas de clientes estrangeiros”, refere a associação. 

Ainda assim, a APICCAPS destaca que “a larga maioria das empresas não alterou o número de pessoas ao seu serviço e as referências a dificuldades financeiras não aumentaram”, sendo que a percentagem de empresas que dizem não ter nenhuma dificuldade “teve até um ligeiro aumento”.

E, se há quem se estreie este ano na MICAM, há também quem – como a Centenário, de Oliveira de Azeméis – já conte mais de 20 anos de feira e, apesar de “se falar muito em recessão”, continue também a ver as vendas crescer quer em volume, quer em valor.

“Até setembro [deste ano] já atingimos o valor [de vendas] de 2022”, avançou à Lusa o diretor financeiro, Pedro Ferreira, projetando encerrar 2023 com um volume de negócios na ordem dos 6,5 a sete milhões de euros, acima dos seis milhões do exercício anterior.

Fundada em 1941 e com 72 trabalhadores diretos, a Centenário exporta sobretudo para o Benelux (Bélgica, Países Baixos e Luxemburgo), Espanha e Estados Unidos e, apesar do foco original no calçado masculino clássico, evoluiu entretanto também para o calçado mais desportivo, seguindo as tendências do setor.

Em contraciclo com a tendência geral do setor está também a marca Ambitious, da empresa de calçado Celita, de Guimarães, que prevê encerrar 2023 com vendas de 24 milhões de euros, face aos 21 milhões de 2022.

Em declarações à agência Lusa, o ‘brand manager’ da Ambitious, Pedro Lopes, destaca que a marca “tem vindo a crescer exponencialmente nos últimos cinco anos”, representando já quase 40% da faturação do grupo Celita, enquanto a produção para ‘private label’ (marca de distribuidor) se tem mantido estável.

Embora reconheça que os atuais sinais de abrandamento económico “obrigam a alguma preocupação”, o responsável diz que a empresa definiu como prioritária a aposta em novos mercados, como o Reino Unido e a Escandinávia, de forma a contrariar esta tendência.

“Há duas estações iniciámos com um parceiro no Canadá e nos Estados Unidos e penso que no próximo ano este será um mercado que, para nós, vai crescer bastante. É um mercado difícil, mas a estrutura está lá e, a partir do momento em que começarmos a conseguir entrar nos pontos de venda, o crescimento é enorme”, referiu.

À Lusa, o diretor de comunicação da APICCAPS fala numa “fase conjunturalmente difícil”, mas garante que o setor “está a procurar resistir”.

“No plano setorial praticamente todos os principais ‘players’ do setor estão com quebras na produção e nas exportações, mas a indústria portuguesa do calçado está a procurar resistir e está na MICAM à procura de novas oportunidades, que esperamos que surjam já em 2024”, sustentou Paulo Gonçalves.

“Aliás – acrescentou – as principais instâncias internacionais sugerem que 2024 será melhor do que 2023, pelo que esta é a altura de mobilizar o setor e de ir à procura de novas oportunidades, para que as empresas portuguesas estejam na linha da frente quando a retoma económica se efetivar”.

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