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Amor de adolescente

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Mesmo assim, aos poucos fui conquistando a simpatia pela rapariga dos cabelos compridos longos lisos e sedosos que tinha, naturalmente, um nome, Conceição, São, em termos mais práticos e diários. Um nome que passou a fazer parte da minha vida, da minha existência, como se a ele, pelo que ele representava, me conectasse sem reverso. Passaram a ser as letras mais importantes da minha vida. Quando escrevia o nome numa carta que a maior parte das vezes não tinha coragem para enviar, num bilhetinho, na contracapa dos meus cadernos escolares, mas acima de tudo timbradas na minha mente, no meu pensamento por tanto delas fazer uso em noites mal dormidas, em momentos de solidão e sofrimento de amor.

Sofrimento de amor que guardava só para mim, que tentava esconder numa aparente e descontraída atitude perante a vida e os seus desígnios, como se tudo estivesse bem, sem problemas de maior.

Convenci-me a mim mesmo que amava esta miúda que parecia ter saído de um conto de fadas, qual princesa de um reino onde eu queria ser rei.

Mas a donzela tirara-me a paz, apesar desta maravilhosa sensação, deste novo sentimento de amor e ao mesmo tempo sofrimento, uma espécie de agridoce, ou antes, doce-amargo uma vez que o sofrimento era a consequência do doce não correspondido.    

E tudo isto estaria muito bem, seria até muito bonito, provavelmente poderia, numa ou outra pessoa mais afeita a sentimentalismos, provocar uns ais que se soltariam acompanhados de um suspiro de ternura e apreço pela boniteza que a paixão sempre deixa transparecer, se, a donzela retribuísse da mesma maneira, ou até similar, tamanho ardor. Mas não era o caso e por isso, a vida deste rapaz, que fazia rir todos os seus colegas e amigos de turma, que parecia ser tão destemido perante todos os professores, levando em muitas ocasiões alguns deles ao desespero, pelo abuso excessivo do seu comportamento, para se armar em palhaço e dar nas vistas, não era o que parecia ser. Preenchia assim o vazio e a frustração de um amor não correspondido. E que me criticassem os outros, aqueles que recriminavam esse mesmo comportamento, que em alguns casos me castigavam por isso, que nenhum deles sabia, ou sequer lhes passaria pela cabeça que aquele palhacinho, aquele rapaz destemido, aquele brincalhão, aquele audaz atrevido, sofria a bom sofrer, mesmo que isso fosse algo que estivesse única e exclusivamente no segredo dos deuses.

Amar já eu sabia muito bem o que isso significava, sofrer. Era tão simples como isso. Mas menos simples era saber o que fazer com esse novo sentimento, como lidar com ele, o que fazer em relação a ele. Perguntar aos mais velhos e experientes? Não faltaria mesmo mais nada. Haveriam de se rir pouco na minha cara, – “fedelho…amar…? Sabes lá tu o que isso significa. És muito novo para te meteres em coisas de adultos. Agarra-te é à faneca e aperta-lhe o pescoço, que é para o que tens idade.” – E estas palavras seguidas de fortes e tresloucadas gargalhadas eram mais do que suficientes para que acordasse a transpirar de maneira ofegante e quase assustadora, olhando em redor do quarto ainda escuro, tentando perceber se tudo não passaria de um sonho maluco ou se era de facto realidade. Nenhum dos que me rodeavam ou que comigo conviviam mais amiúde lhes poderia passar pela cabeça os fantasmas com que tinha este miúdo que lidar, e tudo porque se apaixonou e não era correspondido, ele que tinha a vida pela frente, mas a confiança muito para trás.

(Confissões de um toxicodependente – excerto do capítulo 1)

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