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Uma coisa à antiga – Parte 2

Eu nunca tive assim grande ideia de ter a noção da primeira vez em que fui de férias. Lembro-me que quando começavam as férias escolares, éramos reencaminhados para casa dos meus avós. Como os meus avós paternos e maternos viviam a cerca de um quilómetro de distância, alternávamos o castigo de aturar os putos equitativamente.

Na aldeia de Santa Cruz do Bispo onde eu passei grande parte da minha infância, existia um bairro “filho da mãe”, que era de deixar aterrorizado o pessoal de qualquer bairro problemático de hoje. Eu não vou escrever o nome do bairro, mas grande parte desse bairro pertencia à minha avó paterna! A minha avó também era a proprietária da única mercearia da zona, mercearia que também servia de taberna e local de convívio. E eu era muito bem tratado porque quem me fizesse mal, ou era despejado da casa ou então tinha o crédito cortado. Ou seja, eu era mimado pelo pessoal sob ameaça, o que digamos, e atendendo às circunstâncias, era bastante seguro.

Sabem onde é Santa Cruz do Bispo? Para quem não saiba, Santa Cruz do Bispo a sul começa junto ao IKEA de Matosinhos e acaba uns 3 quilómetros antes do aeroporto de Pedras Rubras. Gosto de chamá-lo Pedras Rubras e não Sá Carneiro, pois não tenho o humor suficiente negro para dar o nome de um aeroporto a alguém que morreu num desastre de avião. Quem vai para Viana, fica à direita.

A mercearia da minha avó era enorme e tinha dois funcionários. Um deles deveria ter cerca de 10 anos, o dobro da minha idade na altura. Eu acho que nestes meios pequenos e um bocado brutos, um fulano com 10 anos que não trabalhasse, ou queria ser doutor, ou então era preguiçoso. Na verdade, o conceito de adolescência é muito recente e os putos de 10 anos eram apenas homens pequeninos. Tinham tirado a 3ª classe e toca a trabalhar que a vida não tinha sido feita mandriões.

Entre diversas tarefas que o puto tinha que fazer, uma delas era transportar-me de casa dos meus avós paternos para a casa dos meus avós maternos e vice-versa. E se no início íamos a pé de uma casa para a outra, depois, colocamos rodas num caixote de madeira, o tipo que ia à frente a servir de animal de tracção, puxava o carro e quando um de nós tivesse cansado, trocávamos de função. Tenho memórias disso porque era uma excelente diversão, e como o piso era muito irregular, volta e meia o caixote com rodas virava-se provocando uma risota geral, e nas descidas aquilo não tinha travões nem volante.

As minhas férias quando tinha quatro ou cinco anos eram assim, com tardes e manhãs que nunca mais acabavam, e depois chegavam os meus primos também para passarem férias em casa do meu avô materno e aquilo ficava uma espécie de creche de putos com vontade de fazer merda.

Essa casa e respectiva propriedade tinha uns muros muito altos em granito. No cimo dos muros, havia vidros quebrados para os eventuais ladrões se cortarem todos caso ousassem assaltar a propriedade. Havia também umas escadas dentro da propriedade que subindo, ficávamos ao nível do muro e podíamos ver e interagir com quem passava e o problema era esse.

O Fernando Alfredo mandava porque era o mais velho e tinha sempre boas ideias para lixar quem passava naquela rua. A Fátima, a Luísa, eu, o Zé Luís e o Zé Manel servíamos de retaguarda e caso houvesse problema, garantirmos firmemente que quem começou a guerra foi quem estava a passar na rua! Podem não acreditar, mas das primeiras coisas que uma criança aprende na vida, é a mentir. E claro que tínhamos o desgraçado que apanhava com todo o nosso capacidade de tortura, que era o primo Zé Miguel, o desgraçado de serviço.

Nesta altura estaríamos nos finais dos anos 60, e se me apetecer, continuo a história amanhã.

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