BRICS: a nova potência económica a desafiar a hegemonia global

Nos últimos anos, o mundo tem assistido a uma mudança sísmica na ordem económica internacional. O bloco BRICS – originalmente composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – tem vindo a afirmar-se como uma alternativa ao domínio económico do Ocidente. Com a possível adesão de novos países, como Indonésia, Arábia Saudita, Irão, Egito e Emirados Árabes Unidos, a aliança ganha uma nova força e desafia ainda mais a hegemonia dos Estados Unidos e da União Europeia.
A crescente influência dos BRICS não é uma tendência passageira, mas sim um reflexo da transição para um mundo multipolar. Representando mais de 40% da população mundial e aproximadamente 31,5% do PIB global em termos de paridade de poder de compra (PPC), o bloco tem vindo a consolidar a sua posição como uma força motriz no comércio e nas finanças internacionais.
Mas quais são as verdadeiras implicações do fortalecimento dos BRICS? Como poderá esta aliança moldar o futuro da economia global? Neste artigo, analisaremos a expansão do bloco, a proposta de uma moeda comum para desafiar o dólar, os desafios internos que podem limitar o seu crescimento e o impacto potencial na ordem mundial.
A inclusão de novos países nos BRICS reforça o bloco não apenas economicamente, mas também em termos estratégicos e geopolíticos. A Indonésia, por exemplo, sendo a maior economia do Sudeste Asiático, representa um trunfo fundamental para consolidar a presença do grupo na região. Com uma população de mais de 270 milhões de habitantes e um crescimento económico sustentado, o país pode fortalecer os BRICS ao diversificar a sua base produtiva e industrial.
Por outro lado, a entrada da Arábia Saudita, Irão e Emirados Árabes Unidos traria uma grande vantagem energética. Estes países são alguns dos maiores exportadores de petróleo e gás natural do mundo e a sua inclusão no bloco poderia permitir aos BRICS desafiar diretamente a dominância do petrodólar, um dos pilares fundamentais do poder económico dos EUA. Se as transações energéticas entre estes países passassem a ser feitas em moedas alternativas, como o yuan, o rublo ou até mesmo uma nova moeda dos BRICS, o impacto seria significativo.
O Egito, por sua vez, acrescentaria ao bloco um fator logístico e estratégico crucial, dado o controlo sobre o Canal de Suez, uma das principais rotas de comércio mundial. A adesão de economias africanas e do Médio Oriente reforçaria ainda mais o papel dos BRICS na redefinição das relações comerciais globais.
Uma das propostas mais ambiciosas do grupo é a criação de uma moeda comum que possa ser utilizada nas transações comerciais entre os países membros. Atualmente, o dólar norte-americano domina o comércio global e os sistemas financeiros, conferindo aos EUA um poder económico desproporcional.
Se os BRICS conseguirem estabelecer uma moeda própria, baseada num cabaz de moedas nacionais ou em ativos estratégicos como ouro e petróleo, o impacto poderá ser revolucionário. Os principais benefícios desta moeda seriam:
- Redução da dependência do dólar – Evitando sanções financeiras dos EUA e reduzindo a volatilidade cambial.
- Maior autonomia financeira – Fortalecendo as economias emergentes e reduzindo a influência de instituições como o FMI e o Banco Mundial.
- Facilitação do comércio intra-BRICS – Reduzindo custos de conversão e fortalecendo a integração económica entre os membros.
No entanto, criar uma moeda comum não será fácil. Existem desafios significativos, como as disparidades económicas entre os países membros, a necessidade de coordenação das políticas monetárias e a confiança no novo sistema.
Dentro do bloco BRICS, a China tem um peso desproporcional. Sendo a segunda maior economia do mundo e uma das principais potências exportadoras, Pequim tem procurado aumentar a utilização do yuan nas transações internacionais.
O governo chinês já estabeleceu acordos bilaterais com vários países para permitir transações em yuan, reduzindo a dependência do dólar. Se os BRICS não conseguirem criar uma moeda comum, o yuan poderá acabar por se tornar a alternativa natural ao dólar dentro do bloco.
O fortalecimento do yuan como moeda de reserva global pode ser um passo crucial para reduzir o domínio financeiro dos EUA. No entanto, isso pode gerar tensões dentro do próprio grupo, com países como a Índia a recearem uma excessiva influência chinesa.
Apesar do seu potencial, os BRICS enfrentam desafios internos significativos. Entre os principais obstáculos, destacam-se:
1. Diferenças económicas e políticas
Os países que compõem os BRICS têm economias muito distintas. A China e a Índia são gigantes industriais, enquanto Brasil e Rússia são altamente dependentes da exportação de commodities. A África do Sul, por sua vez, tem uma economia mais pequena e enfrenta desafios estruturais.
Além disso, existem rivalidades geopolíticas, como a histórica tensão entre Índia e China. Estas diferenças podem dificultar uma maior cooperação e a concretização de projetos ambiciosos, como a criação de uma moeda única.
2. Falta de estruturas financeiras consolidadas
Os BRICS criaram o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) como alternativa ao FMI e ao Banco Mundial, mas a sua influência ainda é limitada. Para desafiar verdadeiramente o sistema financeiro global, o bloco precisa de investir na criação de instituições robustas que possam competir com as ocidentais.
3. Resistência do Ocidente
Os Estados Unidos e a União Europeia não irão assistir passivamente ao crescimento dos BRICS. Já vemos sanções contra a Rússia e tensões comerciais entre os EUA e a China. É provável que o Ocidente tente minar a coesão do grupo através de pressões políticas, sanções e incentivos a países membros para manterem laços fortes com o sistema financeiro ocidental.
O que esperar do futuro dos BRICS?
O crescimento e a consolidação dos BRICS representam um desafio direto ao modelo económico ocidental. O bloco não pretende substituir o G7 ou o FMI, mas sim criar uma alternativa viável para os países que procuram escapar à dependência das instituições dominadas pelos EUA e pela União Europeia.
A expansão do grupo é inevitável. À medida que mais países procuram fazer parte desta aliança, a capacidade dos BRICS de influenciar a economia global só aumentará. No entanto, existem desafios internos que não podem ser ignorados. Divergências políticas, tensões geopolíticas e diferenças económicas entre os membros podem dificultar uma cooperação mais profunda.
Ainda assim, uma coisa é certa: os BRICS vieram para ficar e estão a transformar-se numa potência económica que pode reconfigurar a ordem mundial. Se conseguirem concretizar os seus planos, incluindo a criação de uma moeda comum e a expansão da sua influência para setores estratégicos, o mundo poderá estar à beira de uma nova era económica, onde o domínio do dólar e das instituições ocidentais será, no mínimo, posto à prova.
O jogo geopolítico está em aberto – e os BRICS são, sem dúvida, um dos protagonistas desta nova era.
António Ricardo Miranda