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A lenda da Tapera do Anhanguera

© Estátua do Bandeirante. Obra do artista Amando Zago, localizada na Praça do Bandeirante, Goiânia, Goiás, Brasil.

A noite desce sobre a fazenda Água Tirada e a lua cheia lança furtivos raios prateados sobre as ruínas de uma casa velha perdida no meio do mato. Envolto na penumbra o espectro do velho bandeirante Anhanguera ainda ronda pelas cercanias de sua antiga morada, ali naqueles confins de Goiás, próximo à margem do rio Corumbá, no coração do Brasil. Dizem que quem por lá se aventurar nas noites enluaradas poderá ver o espectro do velho bandeirante português com seu chapéu de aba larga e calça de algodão arregaçada na canela… A esperar que alguém realmente “corajoso” venha libertar sua alma fatigada, pois ele tem um tesouro a revelar.

Os restos de sua velha morada lá estão envoltos pelo cerrado; árvores enormes cresceram onde antes era o salão da casa grande, mas o batente de aroeira e o alicerce de pedra, ainda podem ser vistos, se a gente se aventurar pelo meio do mato fechado, dos cipós e dos troncos velhos, sem se importar com as picadas dos mosquitos, as cobras e os escorpiões.  

O famoso bandeirante português, desbravador de Goiás, Bartolomeu Bueno da Silva – o Anhanguera faleceu em 19 de setembro de 1740. Era dono de lavras de ouro, possuía vasta fortuna, inclusive, tinha, dentre outras, essa propriedade às margens do Rio Corumbá, próximo ao porto que mais tarde veio a chamar-se “Porto da Eulália”, em homenagem à sua bisneta. Ali ele deixou para a posteridade o legado do seu nome e, dizem, um tacho de ouro enterrado com belas e valiosas esmeraldas, não se sabe com que intuito, provavelmente o de burlar o quinto da Coroa Portuguesa. Sua alma vaga há mais de dois séculos e meio por aqueles sítios em busca de salvação e ele aparece aos transeuntes para dar o tesouro a quem tiver coragem para desenterrá-lo, mas a maioria foge amedrontada.

Há 75 anos, um lavrador, Alvino Damião da Cruz, passando altas horas da noite pelas proximidades da Tapera do Anhanguera, se deparou sob a luz do luar com o espectro do bandeirante.  A misteriosa visão deu a ele o tesouro enterrado, ensinando-lhe com detalhes o local onde estava escondida a riqueza. Mas para que Alvino conseguisse desenterrar o tesouro o “Anhanguera” exigiu que ele levasse consigo o seu afilhado, um garoto de cerca de oito anos de idade.

Alvino Damião, um baiano destemido, convidou, então, um amigo de nome Miguel para acompanhá-lo na aventura em busca do tesouro enterrado e numa noite de lua muito clara lá se foram os dois munidos de pá, enxadão, picareta e água benta, desenterrar o valioso tesouro.

Cavaram no local indicado pelo fantasma do bandeirante e Alvino e Miguel descobriram sob o pesado tronco de aroeira um lugar demarcado, calçado de pedras, que correspondia ao que o espectro do velho português lhe dissera. Animados continuaram cavando, mas não encontravam nada e não conseguiam também retirar o tronco de aroeira, que lhes parecia feito de chumbo. 

Muito depois da meia-noite, quando já tinham cavado um buraco aproximadamente da altura de um homem, em dado momento, Miguel, repentinamente, saiu em disparada gritando como louco: – “Cruz Credo… Corre Alvino, corre…, depressa… Socorro… Socorro…”. 

Ouvindo a gritaria do seu companheiro, Alvino saiu depressa do buraco, pensando que ele tivesse sido picado por uma cobra. Ao alcançar o seu amigo, porém, descobriu que o motivo da correria era outro bem diferente.

Ofegante e apavorado, Miguel a muito custo explicou que lá dentro do buraco, junto com Alvino Damião, tinha “uma coisa muita feia, uma assombração horripilante, misto de gente e de fera, olhos de fogo e chifres pontiagudos na cabeça” que fazia menção de pegá-los. Miguel ficou tão estarrecido de medo que nunca mais quis saber do tesouro do Anhanguera.

 E Alvino Damião voltou a sonhar com o velho português orientando-o para desenterrar a riqueza encantada. Entretanto, a alma do bandeirante o alertou, dizendo que levasse apenas o menino, seu afilhado, mas não levasse o seu amigo Miguel, porque este tinha más intenções para com ele.

Miguel, que jamais quis voltar ao local, apenas sorria sem graça quando alguém mencionava o aviso que, em sonho, a alma do bandeirante dera ao seu amigo.

Alvino pediu aos seus compadres para que deixassem o afilhado ir com ele desenterrar o tacho de ouro, mas a mãe do menino recusou veementemente, talvez receando que, em dado momento, a aparição exigisse a alma da criança em troca do tesouro. E temendo que vencido pela cobiça, Alvino acabasse por ceder, a zelosa mãe nunca permitiu que seu filho se metesse em tal aventura. 

Com o passar do tempo o buraco, escavado por Alvino e Miguel, encheu de água e esta não mais secou. Diz-se que são as lágrimas do bandeirante que, ainda hoje, chora de tristeza porque não terá salvação enquanto não for desenterrado o seu valioso tesouro.

Assim, o desventurado Anhanguera ainda vagueia na solidão das noites goianas… Suas lágrimas continuam, naquele sertão, refletindo indefinidamente a luz do luar… À espera que alguém venha o seu tesouro desencantar… Quem se habilita?

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