De que está à procura ?

Bélgica

O português que gosta de viver em Molenbeek

A viver há dezasseis anos em Molenbeek, Manuel Gomes, um português de 44 anos, considera injustificada a “má fama” desta comuna bruxelense, hoje apontada como um “ninho de radicais islâmicos”, mas onde nunca teve problemas e se sente integrado.

“Eu não sinto esse clima de insegurança, esse clima de que se fala, que parece que a gente está numa zona de guerra, num ninho de extremistas, onde toda a gente anda armada. Não, o dia-a-dia é normal, as pessoas fazem a sua vida”, diz em entrevista à agência Lusa, em Bruxelas.

Admitindo ser um pouco perturbador ver às vezes na televisão que foi ou está a ser levada a cabo uma operação antiterrorista na vizinhança – como aconteceu ainda na segunda-feira, quando a polícia belga cercou um edifício não muito longe da sua casa, em busca de um dos presumíveis terrorristas envolvidos nos ataques a Paris -, Manuel Gomes observa porém que a sensação que se tem é que “não se está a falar do mesmo sítio”.

“Acho mesmo que é uma má fama que deram, porque é bom viver onde eu moro. Tenho espaços verdes, tenho terrenos de futebol onde posso sair, onde posso ir dar uma volta de bicicleta, onde posso ir correr, e até hoje nunca, nunca tive nenhum problema, nunca ninguém na rua me olha de lado porque tenho os olhos azuis ou porque sou de outra nacionalidade”, conta.

Há bairros na comuna “onde é perigoso entrar”, reconhece, mas o mesmo acontece em quase todas as capitais europeias, Lisboa incluída, aponta.

Na sua opinião, “dá a impressão de que essa gente (radicais islâmicos) só passa ali, para preparar o que tem a fazer, e depois «saltam»”, diz, acrescentando que, quando se olha para os radicais que surgem nas notícias, constata-se que “são quase todos de nacionalidade francesa, e acontece é que têm sempre um primo, ou uma tia ou uma cunhada que por acaso mora em Molenbeek”.

A realidade do dia-a-dia, garante, é outra, e “a grande maioria dos magrebinos” que vivem na comuna “são boas pessoas”, com quem se dá, e que “não se reveem no radicalismo islâmico e estão contra isso tudo”.

Natural de Peso da Régua, a viver desde 1987 em Bruxelas, onde trabalha atualmente num restaurante, Manuel Gomes explica que em 2000 “surgiu a oportunidade de ser proprietário, de comprar uma casa em Molenbeek”, e desde então ali vive, com a mulher e uma filha de 19 anos, perfeitamente integrados, apesar de a esmagadora maioria dos quase 100 mil habitantes ser muçulmana.

“O meu barbeiro é marroquino e quando vou lá é uma festa. Quando chego lá é sempre «o português», vem sempre a palavra Ronaldo, e como sou adepto do Sporting também há as referências ao Slimani, porque há argelinos também”, conta, acrescentando que também frequenta talhos e padarias, onde é recebido com palavras como “bom dia” e “mon ami”.

Manuel Gomes admite no entanto que há um problema, “mas que já vem de trás”, com focos de radicalismo islâmicos na comuna de Molenbeek, onde existem 22 mesquitas, o que não deixa de achar “um bocado estranho”, mas aponta o dedo aos agentes políticos, que “nunca se interessaram muito com o que se passava”, deixaram que se criasse uma espécie de gueto, e parece que só agora “abriram os olhos”.

“Já era tempo”, comenta, fazendo votos para que ao menos a má fama conquistada recentemente por Molenbeek leve as autoridades belgas a dedicar mais atenção e a dirigir mais meios a esta comuna, hoje em dia nas «bocas do mundo» pelos piores motivos.

TÓPICOS

Siga-nos e receba as notícias do BOM DIA